
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva pretende despachar ao Congresso Nacional, nos primeiros meses de 2026, um projeto de lei que regulamenta, entre outros pontos, o direito à greve, de forma ampla, no âmbito da administração pública, atendendo assim a um pedido antigo dos servidores.
O projeto a ser enviado regulamentará o direito de greve, de forma ampla, no âmbito da administração pública federal, estadual, municipal e do Distrito Federal. Este será para todos os servidores públicos, mas também para os empregados públicos concursados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) da administração autárquica e fundacional. Não se aplicará, porém, aos empregados das empresas estatais.
A proposta abordará um percentual mínimo de servidores que devem permanecer trabalhando durante a paralisação em atividades consideradas essenciais: 50% no caso de atividades inadiáveis e que trabalhem em regime de plantão, e 20% para os demais. Abusos seriam passíveis de punição.
Esse, aliás, é um dos pontos de “maior conflito”, explicou o presidente do Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas do Estado (Fonacate), Rudinei Marques.
— Estamos com a expectativa de que, no início do ano legislativo, o governo encaminhe (o texto) para o Congresso, quando então a gente vai ter conhecimento das minúcias do texto e vai poder fazer as nossas emendas para melhorar o que for possível — explicou.
O projeto de lei também tocará em pontos importantes, como o direito à compensação dos dias da paralisação mediante a recomposição das demandas represadas e a proteção ao grevista ao vedar a administração pública de demitir, remover ou transferir como punição pela greve; de constranger seus funcionários para dissuadi-los de participar da mobilização; ou de usar a participação na greve para avaliação de desempenho. Vetará ainda a greve para as atividades de Segurança Pública.
Direito assegurado
O direito à greve é assegurado pelo artigo 9º da Constituição Federal de 1988, mas está regulamentado atualmente apenas para os trabalhadores da esfera privada, por meio da Lei 7.783/1989. Na prática, quando uma greve de servidores é judicializada, devido ao vácuo de uma legislação própria para a categoria, aplica-se a lei do setor privado.
— As decisões judiciais normalmente são absurdas, como determinar que a greve é legal, mas que 90% dos trabalhadores têm que trabalhar. Não existe greve assim. O setor público deve ser tratado de acordo com suas características — diz Pedro Armengol, diretor da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e da Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef), para quem essa judicialização é “desfavorável”.
Armengol participou do Grupo de Trabalho Interministerial criado em 2023 para construir o projeto de lei.
Além do direito de greve, o projeto apresenta também outros três eixos: a criação de um sistema de negociação, a representação sindical e liberação de dirigentes, e a sustentação financeira às entidades representativas por meio de contribuição negocial de seus representados.
Horas paradas
No ano passado, foram registradas 880 greves no país, que contabilizaram mais de 35 mil horas paradas, segundo um balanço publicado pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). Os dados foram coletados do Sistema de Acompanhamento de Greves (SAGDieese).
Metade das paralisações foi promovida pelos trabalhadores da esfera privada, enquanto a maior parte das horas paradas (64%) está relacionada às greves no funcionalismo público. Dessas quase 23 mil horas paradas, 43% foram provocadas por greves no funcionalismo federal. Porém, somente 11% duraram mais de dez dias — a maior parte (63%) encerrou-se no mesmo dia.
— A greve é um instrumento jurídico, tanto que ela é prevista na Constituição e na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho). Infelizmente, ela é vista como algo prejudicial à relação econômica, mas não é. A nossa Constituição, antes de prever a economia e garantir a livre iniciativa, ela prevê os direitos sociais — destaca Marcos Jorge, coordenador jurídico especialista em Direito Administrativo do escritório Wilton Gomes Advogados.
O texto agora aguarda o despacho do Executivo para começar o processo de tramitação no Congresso Nacional, como a análise pelas comissões técnicas da Câmara dos Deputados.
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