Apoiada pela Organização das Nações Unidas (ONU), a empresa americana Oceanix está liderando uma iniciativa envolvendo habitações humanas flutuantes de grande escala, atualmente desenvolvendo o que descreve como “a primeira comunidade flutuante resiliente e sustentável do mundo, para 10 mil moradores em 75 hectares”.
“Em relação à elevação do nível do mar, autoridades locais de cidades costeiras têm basicamente duas opções”, diz o presidente da Oceanix, Marc Collins Chen, “Construir uma grande muralha, que provavelmente nunca será alta o suficiente, ou olhar para a última novidade em engenharia, que é flutuar sobre um lugar.”
Embora chamando de “cidade flutuante”, o que a Oceanix está propondo, pelo menos inicialmente, é mais no sentido de grandes bairros flutuantes, expansões aquáticas para megacidades litorâneas já superpovoadas que enfrentam dificuldades com o aumento do nível do mar, como Jacarta, na Indonésia, ou Xangai, na China.
Essas novas “cidades” serão compostas de plataformas triangulares de dois hectares de área, boiando, cada uma abrigando 300 moradores, com espaço adicional para produção agrícola e lazer. Elas podem ser ligadas umas às outras, formando assentamentos cada vez maiores. “Queremos que esses assentamentos não usem nenhum combustível fóssil. É tudo com energia renovável, e estamos tentando cultivar 100% de nossas necessidades proteicas a bordo.”
Cidades flutuantes podem parecer algo vindo direto de páginas de livros de ficção científica, mas na verdade nós, humanos, temos vivido e cultivado alimentos em ambientes flutuantes há séculos. “Nós compilamos uma lista de 64 casos para estudo de comunidades indígenas flutuantes ao redor do mundo”, diz Julia Watson, professora de Design na Universidade Harvard, nos Estados Unidos, e autora de Lo-Tek: Design by Radical Indigenism, livro que explora lições de design que podemos aprender com culturas indígenas.
“Mais que isso, esses sistemas indígenas sempre foram inerentemente sustentáveis, algo que nossas cidades atualmente não são.” Exemplos de comunidades flutuantes ainda podem ser encontrados hoje em dia, como as ilhas de cultivo de cana do povo Uru, no lago Titicaca, na fronteira entre Peru e Bolívia. Jardins flutuantes são ainda mais comuns, notadamente em Bangladesh, onde agricultores plantam sementes em espécies de jangadas feitas de plantas flutuantes, que sobem e descem conforme as cheias que ocorrem devido às monções anuais.
Faz sentido que a Holanda seja a primeira nação a experimentar a ideia de casas flutuantes, considerando a tradição verde do país e sua história de arquitetura e desenho inovadores. O país também é o que fica no nível mais baixo da Europa, fazendo com que a elevação do mar represente uma ameaça real. Porém os holandeses não estão realizando experiências apenas com casas flutuantes. Cinquenta e cinco quilômetros ao sul de Amsterdã foi criada uma fazenda que seria adaptada às mudanças climáticas. Inaugurada em 2019, tem 40 vacas que circulam entre um pasto ao lado das docas e uma estrutura flutuante, a primeira do tipo no mundo.
A fazenda produz leite, queijo e iogurte (assim como adubo), que são transportados por distâncias curtas até os consumidores por meio de bicicleta ou van elétrica. Enquanto isso, restos vindos da cidade, restos de comida de restaurantes e a grama que sobra do estádio do clube local de futebol servem de alimentos para as vacas.
De certa forma, ironicamente, foi a construção de grandes cidades que levou ao desaparecimento de muitas dessas habitações e práticas aquáticas, que agora estão sendo cogitadas como o futuro da vida urbana.
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