Quando o assunto é uso medicinal da maconha, o Rio Grande do Norte está na retaguarda de diversos estados do Brasil, como é o caso da Paraíba, onde uma organização planta Cannabis para centenas de pacientes com autorização da justiça. O estado potiguar conta apenas com iniciativas pontuais, que nadam contra a corrente de atraso e preconceito para que crianças, adultos e idosos doentes tenham uma qualidade de vida melhor.
No RN, a ONG sem fins lucrativos “Reconstruir” busca na Justiça Federal uma autorização para cultivar a planta e extrair o óleo da Cannabis para os pacientes associados. Os advogados subscritores da ação, Gabriel Bulhões e Carla Coutinho, destacam que a autorização judicial visa dar maior segurança aos enfermos e seus familiares, já que o vegetal ainda é proscrito na interpretação de alguns juristas, além de possibilitar que famílias de baixa renda possam ter acesso ao remédio, já que o custo da importação é alto e o cultivo coletivo o diminui consideravelmente, permitindo o acesso à saúde de todos que necessitam.
“Reconstruir vidas e também o conceito de Cannabis na sociedade”, são os objetivos que mobilizam o coletivo na promoção de debates para disseminar conhecimento para médicos, juristas e população em geral. A autorização judicial, a exemplo do que ocorre com a ONG Abrace Esperança, da Paraíba, pode beneficiar 80 pessoas cadastradas na ONG e mais outras 100 que estão em uma fila para se associar, desde crianças com microcefalia até idosos com doenças degenerativas.
Um dos exemplos de superação de barreiras é o da mãe do empresário Yogi Pacheco, de 36 anos, que sofria com crises constantes e tinha uma baixa qualidade de vida antes do uso da Cannabis como um tratamento alternativo à medicina tradicional. Acometida com mal de Parkinson há 14 anos, a idosa, de 66 anos, usa o óleo extraído da Cannabis cultivada por seu filho com autorização do juiz Walter Nunes, da 2ª Vara Federal do Rio Grande do Norte, que lhe concedeu habeas corpus preventivo.
“Minha mãe tomava drogas pesadíssimas, que deixavam ela completamente desorientada e com muitos efeitos colaterais”, lembra o Yogi, sobre a introdução da Cannabis no tratamento da mãe. Com um pai militar e a mãe considerada conservadora, o primeiro grande obstáculo que enfrentou foi o preconceito no seio familiar. “Minha mãe sentiu um benefício enorme quando usou, mas ela me questionava sobre ‘virar maconheira’. O peso dos benefícios foi maior do que o preconceito”, disse Yogi.
Fora o caso da mãe de Yogi Pacheco, em que o cultivo para fins medicinais está protegido pela justiça, outras pessoas que precisam da Cannabis no Rio Grande do Norte se deparam com três opções: a importação do exterior, trazer de outros estados ou recorrer a traficantes de droga locais.
“Falta boa vontade dos médicos locais em estudar, porque artigos científicos não faltam, para epilepsia, depressão, insônia, fibromialgia e diversas outras doenças. Se faz um esforço para não saber, porque as informações estão disponíveis”, defendeu Yogi Pacheco.
Uma das coordenadoras do coletivo potiguar Delta 9, Adriana Lamartine, esclareceu que a Reconstruir não pretende a permissão indiscriminada para o cultivo da Cannabis, mas sim, a autorização para realizar o cultivo e preparar o remédio com componentes químicos específicos exclusivamente para quem precisa, mediante prescrição médica.
O intuito, como explica Adriana, é tratar doenças graves, sendo sua conduta e compromisso de cultivar somente o necessário para o preparo do óleo, sob supervisão da Anvisa ou de outro órgão responsável. “O nosso objetivo é ajudar pessoas, Cannabis sempre foi remédio e continuará sendo”, frisou Adriana Lamartine.