
SISTEMA DUAL TEM COMO BASE A FORTE INTEGRAÇÃO ENTRE A SALA DE AULA E A PRÁTICA NAS EMPRESAS
Dando continuidade à extensa programação que cumpre até o final desta semana no estado alemão da Renânia-Palatinado, a comitiva potiguar participou de um workshop sobre o Sistema Dual de Formação e Aperfeiçoamento, ministrado pelo consultor da Câmara de Comércio e Turismo da cidade de Trier, Christian Reuter. O sistema tem como base a forte integração entre a sala de aula e a prática nas empresas, sobretudo nas áreas de comércio, serviços, turismo e indústria; além da total ausência do Poder Público no relacionamento entre empresas e alunos.
O Sistema Dual forma por ano 4.200 pessoas apenas em Trier e 780 mil na Alemanha inteira. Todas as formações são de, no mínimo dois anos, podendo chegar a três. A cada ano, dois mil novos aprendizes se inscrevem em algum curso do Sistema Dual apenas nas cidades da região dos rios Mosel e Reno. São cerca de 180 profissões incluídas no formato Dual que tem, entre suas caraterísticas, um modelo rígido de avaliação final, que inclui até três avaliadores para cada exame.
O maior diferencial do Sistema Dual é que um terço do tempo total do curso é realizado dentro das empresas, com os formandos atuando como aprendizes por até oito horas por dia. A formação no modelo Dual é equivalente a uma graduação universitária (terceiro grau). A Alemanha é o país onde o modelo é mais popular no mundo. Estima-se que cerca de um terço dos jovens alemães encaminhem sua vida acadêmica para o formato Dual, contra uma média de 10% no restante da Europa. Vale ressaltar que o trabalhador alemão é considerado um dos mais bem preparados do mundo em diversas áreas, incluindo a Gastronomia, a Manufatura (indústrias variadas) e o Turismo.
“É muito importante ressaltarmos que o aprendiz do Sistema Dual não é tratado pelas empresas como mais um dos seus colaboradores. Há uma preocupação em, de fato, qualificá-lo para aquela profissão e, em muitas empresas, áreas inteiras específicas para a atuação dos aprendizes do Sistema Dual”, afirmou o consultor da IHK Trier, Christian Reuter. O percentual de absorção efetiva dos profissionais formados pelo Sistema Dual pelas empresas alemãs é de “praticamente 100%”, segundo Reuter.
Legislação no Brasil é barreira
No workshop ministrado para a comitiva potiguar, duas coisas ficaram muito claras. A primeira é que o profissional formado por meio do Dual tem um nível de qualidade primoroso e é, em sua maioria, o que os europeus chamam de “multitarefa”. O profissional de Gastronomia, por exemplo, é um verdadeiro Gestor de Alimentos e Bebidas, participando ativamente de todas as etapas do processo de gerenciamento do setor de A&B, desde a escolha dos fornecedores, negociação de preços, adequação de cardápios e aquisição dos insumos. E isto não apenas nos hotéis mas, também, em restaurantes.
O outro ponto que ficou claro é que este leque maior de qualificação e habilidades garantido pelo Formato Dual esbarra em questões da legislação trabalhista brasileira. “Infelizmente, boa parte dos nossos profissionais formados para o Turismo não conseguem ter uma visão mais ampla do negócio onde eles trabalham. E isso é ruim para as empresas e para o colaborador, que poderia, entre outras coisas, ser melhor remunerado em virtude de desempenhar mais funções. No entanto, ainda esbarramos na legislação trabalhista”, comentou o presidente da ABIH RN, José Odécio Rodrigues.
O presidente da seccional potiguar da Associação Brasileira dos Agentes de Viagem (Abav RN), hoteleiro Abdon Gosson, reforçou o entendimento de Rodrigues dizendo que, infelizmente, a maioria das coisas que viu sobre o Sistema Dual são utópicas para a realidade brasileira. “Temos o Código Brasileiro de Ocupações, o CBO, que é extremamente rígido e pouco abrangente. Não podemos investir na formação de um profissional que tenha um espectro mais amplo de atuação e qualificação porque vivemos sob a ameaça do chamado ‘desvio de função’. Sem dúvida, isto tolhe severamente a mudança no perfil do profissional de turismo. Do perfil e até dos valores de sua remuneração”, disse Gosson.
O consultor da IHK Trier fez questão de pontuar que na Alemanha, dentro do Sistema Dual, o investimento na qualificação dos profissionais dentro da empresa é totalmente do setor privado e que não há interferência nenhuma do Poder Público nem mesmo no percentual de alunos-estudantes que precisam ou podem ser mantidos. “O mercado regula isso. É importante para o empresário ter profissionais melhor qualificados e que possam atingir mais rapidamente a integralidade da sua produtividade. Nossa filosofia é dar um ensinamento que seja o mais amplo possível e ainda criar novas linhas de qualificação em perfeita sintonia com o que o mercado, com o que o consumidor espera das empresas”, disse.
“Sabemos de todas as limitações e dificuldades, mas iremos continuar debatendo formas de levar para o Rio Grande do Norte pelo menos uma versão adaptada do Sistema Dual, evoluindo a partir de alguns formatos que já temos no Senac. Inclusive, em dezembro deste ano, receberemos o Christian Reuter em Natal para darmos sequência aos pontos que precisam ser trabalhados”, afirmou o presidente do Sistema Fecomércio RN, Marcelo Queiroz.

