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Reforma da Previdência: veja os pontos que devem mudar na aposentadoria

NOVAS REGRAS DEVERÃO INCLUIR AINDA IDADE MÍNIMA PARA PODER REQUERER APOSENTADORIA E PERÍODO DE TRANSIÇÃO.(FOTO: ARTHUR MENESCAL/ESP. CB/D.A PRESS)

A reforma da Previdência recebe, nos próximos dias, os últimos ajustes antes de ser apresentada ao presidente Jair Bolsonaro. A equipe econômica ainda não bateu o martelo sobre os detalhes da proposta, mas adiantou alguns pontos básicos que devem afetar a vida de praticamente todos os brasileiros. As mudanças serão propostas pelo Palácio do Planalto, mas ficarão durante meses nas mãos dos parlamentares, que serão os principais responsáveis pelo texto final.

A ideia do governo é que quem entrar no mercado de trabalho, a partir de agora, passe a poupar dinheiro em uma conta individual para pagar pela própria aposentadoria no futuro — o chamado regime de capitalização. Quem já contribui para o sistema atual precisará encarar algumas mudanças nas regras. “Não vai ser exatamente um novo regime, mas uma mistura dos dois”, explica uma fonte a par das negociações.

A primeira delas é o estabelecimento de uma idade mínima para aposentadoria, com diferenciação entre homens e mulheres. Várias propostas têm sido estudadas sobre o assunto, considerado essencial para conter as aposentadorias precoces. Uma das opções é retomar o que ficou na versão final da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 287/2016, do ex-presidente Michel Temer, após as várias mudanças feitas pelos deputados: 62 anos para mulheres e 65, para homens, com transição de 20 anos.

O corte começaria a valer com idade mínima de 57/60 e, a partir da aprovação da reforma, seria acrescentado um ano nessa conta a cada dois anos, até chegar aos 62/65. Depois, continuaria subindo de acordo com o aumento da expectativa de sobrevida da população. A regra seria a mesma para os servidores públicos, cuja idade mínima atual é de 55/60.

Embora Bolsonaro tenha anunciado recentemente que a idade mínima seria de 57/62, essa opção é uma das menos discutidas pela equipe econômica, por ser considerada insuficiente. Não daria margem para negociação no Congresso. A transição também ainda está em estudo, mas, segundo o ministro da Economia, Paulo Guedes, terá a “mesma profundidade” da que havia sido proposta por Temer, de 20 anos.

Classe média

A proposta de capitalização afetará diretamente a vida dos contribuintes de classe média, se for adotada alguma das ideias estudadas atualmente pelo governo. Todas mantêm, em algum nível, um sistema de repartição para quem recebe menos que algo entre R$ 2,2 mil e R$ 3,9 mil (corte a definir). Quem ganha mais que isso passaria a ser vinculado obrigatoriamente às contas individuais. Alguma parcela do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) poderia ser usada para manter essas contas.

Como valeria apenas para os novos contribuintes, a mudança demoraria pelo menos 30 anos para fazer efeito, quando eles se aposentarem. “É uma forma de plantar uma semente para o futuro, mas não teria impacto agora”, explica o economista Pedro Nery, autor do livro Reforma da Previdência – Por que o Brasil não pode esperar, também assinado pelo economista Paulo Tafner.

Um dos problemas que têm gerado divergências na equipe econômica é justamente como cobrir o custo de transição ao longo desse tempo. Ao migrar para a capitalização, o dinheiro das contribuições deixaria de ir para o INSS e passaria para o mercado financeiro, deixando os beneficiários atuais desamparado. Por isso, é “evidente a necessidade de formatar um fundo de compensação”, diz o secretário especial de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho. A dúvida é sobre de onde virão os recursos. “Isso ainda está sendo decidido.”

Uma das sugestões é criar um fundo com valores de várias origens, como os 40% do PIS que hoje são repassados ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), entre outras fontes. A ideia partiu do economista Hélio Zylberstajn, da Universidade de São Paulo (USP), e foi apresentada por emenda na comissão especial que aprovou a PEC de Temer. Ela já está pronta para ser votada no plenário da Câmara e poderia ser retomada adotando essa sugestão.

Zylberstajn sugere a capitalização compulsória para quem nasceu a partir de 2005 e entrar no mercado de trabalho de 2020 para a frente. Quem receber menos de R$ 2,2 mil por mês não precisaria migrar para contas individuais. Outra proposta, feita por uma equipe de especialistas que inclui os economistas Paulo Tafner, Leonardo Rolim (atual secretário de Previdência) e o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga, sugere que o novo regime seja obrigatório para os nascidos a partir de 2014, que recebam mais que R$ 3,9 mil por mês.

Um dos medos dos contribuintes, quando se fala em capitalização, é o risco de que o retorno futuro seja menor do que um salário mínimo mensal, como aconteceu no Chile recentemente, 30 anos depois de o governo privatizar e capitalizar a Previdência. Muitos chilenos não conseguiram acumular uma poupança digna. “O assunto é muito mais complexo do que introduzir uma idade mínima. Precisaria de meses de discussão com a sociedade e com a classe política para não cairmos nos mesmos erros do Chile”, avalia a advogada Adriane Bramante, presidente do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP).

Para dissipar essas preocupações, a lógica com a qual o governo tem trabalhado é a mesma sugerida pelo Banco Mundial, de não sustentar a Previdência em apenas um pilar. No Brasil, manter apenas o sistema de repartição levou ao deficit bilionário, que deve chegar a R$ 308 bilhões este ano. Mas ter somente capitalização, como aconteceu no Chile, poderia resultar em um caos ainda maior, com pessoas recebendo aposentadorias abaixo do salário mínimo. “A ideia é adotar um sistema que não se sustente em apenas um desses pilares, mas que garanta uma renda mínima para todos quando chegarem aos 65 anos”, diz Zylberstajn. (veja quadro)

Medidas polêmicas

Alterações no sistema de aposentadorias, consideradas fundamentais para reduzir o desequilíbrio das contas públicas, vão mexer com a vida dos cidadãos

> Como é

Solidário

O regime adotado atualmente é o de repartição, pelo qual os trabalhadores da ativa pagam os benefícios de quem já está aposentado.

Insustentável

Com o envelhecimento da população, a cada ano tem mais gente recebendo e menos gente pagando, o que gera o deficit da Previdência.

Desigual

Servidores públicos se aposentam com idade mínima de 60 anos (homens) e 55 (mulheres), enquanto trabalhadores da iniciativa privada podem se aposentar a qualquer idade, desde que tenham contribuído por 35 anos (homens) ou 30 anos (mulheres).

Especial

Há regras diferenciadas para professores, militares e aposentadoria rural.

Mínimo

Nenhuma aposentadoria ou pensão por morte pode ser menor que o salário mínimo (hoje, R$ 998), que é o piso do INSS.

Governista

Os benefícios são pagos e administrados pelo governo, pelo INSS

> O que pode mudar

Individualista

A ideia é adotar um sistema de capitalização pelo qual os trabalhadores pagam pela própria aposentadoria, em uma espécie de poupança individual.

Transição cara

O custo inicial é muito alto, porque as pessoas deixariam de contribuir para quem já está aposentado. Por isso, a transição é longa e/ou seria necessário um fundo para cobrir o período até que todos passem a contribuir pela capitalização.

Renda básica

O governo se responsabilizaria por um valor mínimo mensal pago a todos os idosos a partir de 65 anos. Mas o valor ficaria entre 58% e 70% do salário mínimo vigente.

Desvinculado

O salário mínimo deixaria de ser o piso também para outros benefícios, como pensão por morte.

Novas regras

O sistema de repartição seria mantido para quem recebe menos, com um corte a ser definido.

Idade

Estabelecimento de uma idade mínima para aposentadoria, entre outras regras de cálculo de benefícios

Menos privilégios

As regras seriam iguais para servidores públicos e para trabalhadores da iniciativa privada. Mas os militares, se entrarem na reforma, terão regras diferenciadas

Sistema privado

Entidades privadas, como bancos e seguradoras, seriam responsáveis pelo gerenciamento dos fundos individuais.

Fontes: Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), Senado Federal, Câmara dos Deputados, Ministério da Economia, especialistas.

Pensões terão ajuste

Aposentadoria é a preocupação número um dos cidadãos quando se fala em reforma da Previdência, mas mudanças na pensão por morte também estão no radar do governo. Algumas poderão ser incluídas na medida provisória que será editada pelo governo nos próximos dias, como o endurecimento das regras de concessão do benefício. Outras dependem de alteração constitucional, portanto, precisariam entrar na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) em elaboração pelo Ministério da Economia.

Uma das sugestões que têm sido estudadas pela equipe econômica, mas não podem entrar na MP, é desvincular o benefício do salário mínimo, como também foi proposto no texto inicial da PEC 287/2016, enviada pelo ex-presidente Michel Temer. De início, a pensão seria de 60% ou 70% do salário mínimo (de R$ 998, hoje). O valor subiria de acordo com o número de dependentes do pensionista — 10% a mais para cada um. Um beneficiário que tenha apenas um filho, no primeiro caso, receberia R$ 698,60: os R$ 598,80 que correspondem a 60% do salário mínimo, mais R$ 99,80, que seriam os 10% relativos ao único dependente.

Embora a fórmula de cálculo possa ser mudada por MP ou projeto de lei, é preciso mudança constitucional para que o benefício seja abaixo do valor do salário mínimo. Também foi ventilada a possibilidade de limitar o acúmulo de pensões. Nesse caso, quem recebe dois benefícios passaria a receber o maior deles e alguma percentagem do segundo. Ou, por outra sugestão estudada, poderia acumular até o limite do teto do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), hoje de R$ 5.839.

Nenhuma dessas mudanças foi confirmada pela equipe econômica, mas o grupo afirma que uma reforma sem tocar em pensão teria efeitos limitados. Cerca de 7,7 milhões de pensões por morte são emitidas por mês pela Previdência, um gasto de aproximadamente R$ 14 bilhões.

Fraudes

Mesmo que as novas regras não sejam incluídas na PEC, o benefício deve ser alterado pela “MP antifraude” que o governo pretende editar na próxima semana. Um dos pontos que devem estar nesse texto é a exigência de comprovantes para quem tem união estável, o que dificultaria a concessão do benefício nesses casos. Hoje, basta ter provas testemunhais.

Outros benefícios que devem entrar na MP são o auxílio-reclusão e a aposentadoria rural. O primeiro, pago aos dependentes de contribuintes presos, passará a ter carência de 12 meses. Atualmente, não há tempo mínimo de pagamentos consecutivos, desde que o segurado tenha contribuído pelo menos 18 meses ao longo da vida. A Previdência paga 48 mil auxílios desse tipo por mês, um gasto de R$ 73 milhões.

 

Correio Braziliense

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