Iniciada em 2001, por meio da sanção da Lei Federal n° 10.216, a ressocialização de pacientes com transtornos mentais é uma realidade que está se tornando cada vez mais comum na vida de milhares de pessoas. A lei surgiu como desdobramento da Reforma Psiquiátrica e instituiu a humanização do tratamento, os direitos desses pacientes e o desenvolvimento de políticas de saúde mental, assistência e a promoção de ações de saúde com a participação da sociedade e da família.
A ressocialização é uma luta histórica e fundamental para a humanização, desinstitucionalização dos pacientes e o desenvolvimento e ampliação de tratamentos eficazes, afastando a visão hospitalocêntrica e farmacológica como únicas formas de tratamento.
No Rio Grande do Norte, a referência de unidade para internação psiquiátrica é o Hospital Dr. João Machado, que além de cumprir seu papel social de atendimento à pandemia provocada pela covid-19, vem contribuindo para a isenção de pacientes de volta ao convívio da família e da sociedade.
Um desses pacientes foi o senhor Marcos (nome fictício para preservar a identidade) que iniciou sua história no Hospital em 2013, quando foi encaminhado pelo Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) de Currais Novos. Marcos foi encontrado perambulando pela cidade em estado de desorientação e em precárias condições de higiene.
Desde a sua entrada, o paciente já indicava o desejo de retornar para a sua família, sendo esse desejo a prioridade da equipe de referência do Hospital que conseguiu localizar a família no município de Rondonópolis, no estado do Mato Grosso.
A equipe entrou em contato com os familiares, mas o retorno não foi possível na época. Contudo, o trabalho de humanização e cuidados com seu Marcos continuou com a viabilização de documentos de identificação e a busca de serviços assistenciais como o Benefício de Prestação Continuada (BPC), obtido em 2014.
Como parte do trabalho de resgate da autonomia e independência do paciente, a equipe técnica, utilizando o método “Clinica de Céu Aberto”, possibilitou o retorno do senhor Marcos ao convívio social, alinhado aos cuidados em liberdade.
Em abril deste ano, Marcos foi transferido para “Casa de Apoio Esperança”, implantada pela direção do Hospital, com o objetivo de proteger da Covid-19 os pacientes de longa permanência e contribuir com a desospitalização. Na época, as atividades externas foram suspensas devido a necessidade de implantação do isolamento social, medida de prevenção da covid-19.
Após todos esses anos, o desejo do senhor Marcos continuava o mesmo: “Me mande para o Mato Grosso” dizia ele para a equipe. Com a determinação de toda a equipe e o apoio do Centro de Referência em Assistência Social (CREAS) de Rondonópolis a família foi novamente contatada e se dispôs a acolhê-lo.
Com a intermediação do Hospital, e os recursos financeiros acumulados pelo paciente, no dia 22 de novembro de 2020, a família chegou em Natal para reencontrar e levar seu Marcos de volta ao seio familiar após sete anos acolhido no Hospital.
“Mais uma vitória da desinstitucionalização da loucura que ficará gravada em nossos corações e mentes como parte do alicerce da construção de uma sociedade livre de manicômios físicos e mentais”, desabafa a assistente social do Hospital, Fátima Couto.
A história de seu Marcos é um exemplo da importância da humanização do tratamento de transtornos mentais e enfatiza que a ressocialização desses pacientes é possível e necessária para que eles tenham tratamentos de qualidade e com apoio do núcleo familiar. É também um exemplo do trabalho desenvolvido pelos profissionais do Hospital e a dedicação em garantir um tratamento digno, eficiente e de qualidade para todos os pacientes.