
PARA GABRIEL BULHÕES, A CONSTRUÇÃO DE ALCAÇUZ SIMBOLIZA UM CASO LATENTE DE DANO AO ERÁRIO PÚBLICO
O estado do Rio Grande do Norte deverá se deparar nas próximas semanas com dezenas de pedidos de indenização por parte dos familiares dos presos assassinados ou feridos durante a grande rebelião ocorrida no presídio de Alcaçuz, no último mês de janeiro. A informação é do advogado criminalista e presidente da Comissão de Advogados Criminalistas da OAB/RN, Gabriel Bulhões.
No entanto, o pagamento de indenizações talvez seja o menor dos problemas do governo do Rio Grande do Norte, quando o assunto é Alcaçuz, ou o sistema penitenciário do estado como um todo.
Longe de estar sob o controle das autoridades de segurança pública após os vários dias de rebelião, Alcaçuz continua sendo uma bomba relógio que pode explodir a qualquer momento, segundo revela Gabriel Bulhões.
Para ele, a única solução viável para Alcaçuz seria transformar a estrutura que existe atualmente em um hospital de custódia, ou até mesmo numa colônia agrícola.
“Também seria viável a utilização de alguns pavilhões como fábricas para os presos do regime semiaberto, além da reconstrução do Pavilhão 5, que, aí sim, o Rogerio Coutinho Madruga pode servir novamente como penitenciária de segurança máxima”, explica.
Bulhões acrescenta ainda que “seria um grande erro” destruir o prédio de Alcaçuz e desperdiçar a estrutura que já existe. “Essa estrutura pode ser aproveitada para algumas dessas situações que citei”, destaca.
AÇÕES
De acordo com Gabriel Bulhões, as ações indenizatórias são pertinentes, tendo em vista que o estado, de forma pública e notória, falhou no cumprimento do seu dever legal de zelar pela integridade física e moral dos apenados sob sua custódia.
O criminalista explica que o estado, no exercício do poder que a lei lhe confere de fazer juízo de valor sobre o comportamento das pessoas e lhes impor pena privativa de liberdade, tem o dever de preservar a incolumidade física e moral do preso, conforme prevê a Constituição Federal e a Lei de Execuções Penais. “Por isso, o estado responde objetivamente pela morte de detentos nas dependências de estabelecimento prisional ou de cela de delegacia”, reforça.
Gabriel Bulhões estima que as indenizações pagas aos familiares de detentos deverão girar em torno de R$ 40 a R$ 100 mil reais – valor esse que será arbitrado por um juiz, que é quem tem o livre convencimento motivado e que decide conforme o seu entendimento.
No Amazonas, os familiares de mais de 50 vítimas da cachina no Complexo Penitenciário Anisio Jobim (Compaj), localizado em Manaus, receberão indenizações do Governo pelas mortes dos detentos. Lá, o governo pretende fazer uma negociação com as famílias para que essas indenizações sejam pagas sem que haja a necessidade de processo judicial.
No Rio Grande do Norte, números oficiais da Secretaria de Justiça e Cidadania indicam que 26 detentos foram mortos na guerra entre as facções em Alcaçuz. De acordo com Gabriel Bulhões, caso não tenham advogados, os familiares de detentos podem, inclusive, acionar o governo através da Defensoria Pública.
DANO AO ERÁRIO
Para o criminalista, os equívocos e falhas que envolvem o presídio de Alcaçuz desde a sua construção, simbolizam um caso latente de dano ao erário público, tendo em vista que o equipamento penitenciário, desde que foi erguido, mostrou-se inservível para a sua finalidade.
Além do custo com a construção do presídio que desde o início da sua história expos à opinião pública toda a sua fragilidade, em 2015 o estado investiu a quantia de R$ 8 milhões na reforma de dois pavilhões. Mais uma vez, o dinheiro público escorria pelo ralo. Alcaçuz continuou sendo o que é até hoje – o avesso do que deve ser uma unidade eficiente.
Profundo conhecedor das nuances da Advocacia Criminal e do funcionamento do sistema prisional, Gabriel Bulhões assinala que o governo do Estado irá errar mais uma vez, caso insista na construção de mega-presídios .
Para ele, o correto é investir na construção de vários pequenos presídios, para abrigar de forma pulverizada a população carcerária. Para Gabriel Bulhões, pequenos presídios não só contribuem com as chances de ressocialização dos detentos, como também minimiza a influência das facções sobre eles. O distanciamento dos familiares e a omissão do estado de garantir o cumprimento de uma pena com dignidade, favorece a ação das facções que terminam “adotando” os presos e fazendo o papel que caberia ao Estado.
“As condições indignas dos presídios fazem com que os presos, até por uma questão de sobrevivência, procurem se atrelar uma facção criminosa, que atua no vácuo do estado, oferecendo apoio material e até mesmo psicológico aos detentos”, explica.

