Por Elane Nascimento
Estuda, prepara-se, concorre, trabalha. A jornada é árdua; doe na pele, na alma. Ao longo das últimas décadas do século XX, mais especificamente entre os anos 1970 à década de 1990 e, após a chegada do século XXI, a mulher\mãe ganhou um contexto histórico e cultural diferente da imagem construída pelas gerações passadas. Conhecimento em primeiro lugar, profissão, independência financeira, a luta por alçar voos e conquistar seu “lugar ao sol” no concorrido mercado de trabalho. E lá estão elas, as verdadeiras “mulheres-maravilha”, lidando com os desafios da profissão, conquistando seu espaço, cuidando de suas famílias, do seu lar e, como diz o ditado, “sem descer do salto”.
Da Perfuração e Completação de Poço de Petróleo ao Desafio da Maternidade:
Gisele Moreira, graduada em química pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), mestre, especialista na área de fluido de perfuração e completação de poço de petróleo.
A carreira profissional, com tantas qualificações, não só tinha chances de ascensão como realmente a promoveu. “Foi através da minha especialização que consegui os dois empregos que tive na minha vida. O primeiro foi como professora em um curso técnico, onde ministrava uma disciplina chamada física aplicada a petróleo e gás. Todavia, trabalhei apenas 6 meses e, logo, fui chamada para trabalhar numa empresa terceirizada da Petrobras, especializada em fluidos de perfuração. Comecei a trabalhar em março de 2009. O regime era de embarque 14 por 14, mas, na prática, eram 16 dias fora e 12 dias em casa, isso quando não era chamada para voltar com uma semana de folga”, conta Gisele.
A jornada de trabalho não é nada tranquila, exige garra, pulso firme, muita dedicação e empenho. Os desafios da atividade começam antes mesmo de chegar ao local de trabalho, imagine a situação: primeiro pegar um voo Natal\Rio de Janeiro, em seguida “pé na estrada” num ônibus ou carro e posteriormente mais uma hora no helicóptero até chegar ao destino. Não, não é ficção. Não estamos falando da Super Girl dos cinemas, essa heroína é real.
“Mãos à Obra”
“Minha atividade, basicamente, consistia em monitorar a fabricação e o desempenho do fluido durante todas as atividades que eram exercidas ali. Também, gerenciar tudo que envolvia os produtos químicos destinados à fabricação e tratamento, e elaborar programas para realização de atividades que envolviam o fluido, por exemplo, troca de fluido, limpeza de poço e etc”.
Eis que surge o inesperado…
A carreira esteve sempre em primeiro lugar na vida da nossa guerreira. Primeiro os estudos, a conquista profissional, depois o casamento e por último o “título mãe”. “Casei relativamente tarde, com 31 anos e queria curtir um pouco mais o casamento. Depois, veio a crise do petróleo em 2013 e começaram as primeiras demissões em todo o setor petroleiro. Com medo do desemprego, acabei adiando o sonho de ser mãe. Certo dia, mais ou menos no final de 2014, depois de alguns exames, uma médica falou que eu não poderia ter filhos devido à endometriose que tinha no meu ovário esquerdo. Ao saber dessa notícia, eu passei a desejar um filho mais do que tudo. O mercado estava ruim, eu não queria saber de tais dificuldades, eu queria ter um filho. Assim, começou a minha jornada de tratamentos e, em vez da endometriose diminuir, ela só aumentava. Fiquei muito triste e, na época, minha médica pediu que eu procurasse outro médico, pois estava suspeitando de algo pior. Fiquei arrasada!”, recorda.
Da força ao medo
Até os mais fortes fraquejam no momento em que descobrem que algo não vai bem quando o assunto é saúde. Com Gisele não foi diferente. Os diagnósticos a deixarem transtornada e, como toda mulher com natureza forte, o primeiro pensamento foi de esconder o seu lado frágil para continuar vestindo a “carapaça” da coragem.
“Tinha tanto medo de contar alguém, escondi até dos meus pais e do meu esposo essa informação. Certo dia, minha cunhada me deu uma carona e me perguntou o que estava realmente acontecendo, pois ela notara que eu estava diferente. Perguntei se ela queria realmente saber o que estava acontecendo comigo, pois a sua mãe tinha enfrentado um câncer alguns meses antes e, a família estava ainda muito abalada com a cirurgia e tratamento da doença. Quando eu contei, ela ficou mais preocupada do que eu, mas… fazer o quê?”.
A grande SURPRESA!
“Passaram os dias. Nesse mesmo período, tive uma folga de 21 dias e, no final dela, tive a grande surpresa. Estava grávida! Não precisei de nenhum novo tratamento. Quando sentei na cadeira do médico, para falar sobre o tratamento, já estava grávida e não sabia. Fiquei sabendo, pois eu iria fazer tratamento de varizes e precisava garantir que não estava grávida, e por desencargo de consciência, fiz o exame por conta própria. Fiquei sabendo numa sexta-feira e tinha que viajar numa terça-feira, meu primeiro pensamento foi: Como eu vou dar essa notícia a meus chefes?!”
Após criar uma súbita coragem, veio o momento de comunicar à chefia:
“Criei coragem e liguei. Liguei, primeiramente, para o meu coordenador de Santos, ele ficou super feliz, me parabenizou! Depois, liguei para o gerente (personagem principal do relato acima). Bem, foi mais ou menos assim:
-Bom dia, fulano!
-Bom dia! (Ele já sabia)
– Estou ligando para comunicar que eu estou grávida!
– Hum, hum! (seguiu-se um longo silêncio)
– Estou ligando, também, para avisá-lo que estou com viagem marcada para amanhã e que iria embarcar na quarta-feira. Então é necessário, cancelar minha passagem e colocar outra pessoa para embarcar na sonda.
-Sim, estou providenciando! Entre em contato com RH para maiores informações sobre como você deverá proceder. Você terá que enviar o exame de gravidez.
-Obrigada, tenha um bom dia!
-Bom dia!”
Mamãe de “Primeira viagem”
Os cursos e qualificações preparam profissionais, apenas a vida ensina o “ser mãe”. Com Gisele não foi diferente. Já era tia, conhecia superficialmente alguns cuidados, mas a maternidade, ter um recém-nascido em casa dependendo exclusivamente de si não é algo que se aprende do dia para a noite. “Na primeira noite com Gabriel em casa, minha mãe me ajudou, ele tomou banho, dei de mamar, coloquei para dormir, mas ele só chorava. Levei-o para a minha cama, olhando para ele sem saber o que fazer. Ficávamos eu e Moises olhando para ele admirando e perguntando-nos o que estava acontecendo, será que ele está com dor?”. A mãe logo assumiu o controle e tomou os devidos cuidados com o netinho que apenas sentia frio.
Volta ao trabalho
“Como trabalhava em setor privado, tinha que voltar a trabalhar com 4 meses, porém pedi minhas férias para o final desse período, ou seja, fiquei com Gabriel 5 meses. No dia da viagem, antes de sair, dei de mamar olhando para o meu bebê, segurando o choro para não chorar na frente dele. Ele nem sabia que iria ficar muito tempo longe de mim. Viajei com a cara e a coragem, meus peitos cheios de leite. Sempre que era possível, eu os esvaziava. Quem é mãe, deve saber a dor que eu sentia ao ver o leite escorrer pelo ralo da pia do banheiro, sabendo que meu filho estava com fome em casa”.
Crise
“Um certo dia, mais ou menos no meio do ano de 2018, tive que ir ao escritório da empresa em Natal. Meu esposo e Gabriel ficaram no carro, falei que seria rápido que era só para eu assinar um documento. Saí do carro e fui para o escritório, porém ao chegar lá, acabei demorando um pouco, pois precisava conversar com a secretária e amiga. Gabriel ficou perguntando por mim no carro e não parava. O pai, para acalmar o coraçãozinho dele, levou-o até mim. Eu já estava de saída, quando o vi subir as escadas no colo do meu esposo. Quando ele me viu, ele caiu no pranto tão sentido e se agarrou em mim com toda sua força, chorava e soluçava em meu colo. Conversei com ele, falando mamãe está aqui, mas ele continuava chorando. Foi aí que tive a certeza que ele não estava adaptado ao meu emprego. Na mente dele, eu tinha indo embora trabalhar. Nesse momento, desejei com todo o meu coração de ser mandada embora emprego”.
Em novembro desse mesmo ano (2018), Gisele foi demitida. ‘Foi um sentimento ambíguo, estava triste e feliz ao mesmo tempo, satisfeita e preocupada, mas com certeza, estava me sentindo leve, pois estaria com meu filho todos os dias”, relata.
Gisele comprou uma pequena franquia que ainda está “engatinhando”, mas não desistiu da carreira pela qual tanto lutou. “Apesar de ter comprado a franquia, ainda espero voltar ao mercado do Petróleo”, diz. “O mais importante é continuar andando. E caminhar com minha família ao meu lado, torna o caminho muito mais prazeroso. conclui.
3 Comentários
Linda história, retratando bem a luta das mães modernas! São realmente super-heroinas. ???
Parabéns a todas as mães por sua dedicação e por tudo que representam!
Você,minha sobrinha linda, és uma heroina enfrentou todas as angustias sozinha! Tenho certeza que foi pra não preoculpar seus pais… Você é e sempre será uma benção! Parabéns pela fé e força de vontade, pra mim você será sempre uma vitoriosa! Te amo linda!!
Muito obrigada, tia Nilsa! Obrigada a Elane Nascimento por escrever uma parte da minha história!