O Rio Grande do Norte poderá ter um prejuízo de até R$ 421.121.838,69 no fim da concessão pública da Arena das Dunas, erguida para a Copa do Mundo de 2014. Isso é o que aponta o relatório de uma auditoria realizada pela Controladoria Geral (Control), divulgado nesta segunda-feira (11). O valor total diz respeito a recursos que podem ser “recuperados” e outros que podem ser economizados até o final dos 20 anos de vigência do contrato.
Os prejuízos atuais já estariam em cerca de R$ 110 milhões. A Controladoria recomendou que o governo suspenda os pagamentos fixos mensais – de cerca de R$ 8,5 milhões – até que a diferença seja equalizada e que, ao retomá-los, o Estado reduza os valores pagos mensalmente. A empresa responsável pela Arena ainda teria deixado de repassar R$ 16 milhões de lucros em eventos.
Em nota, a Arena das Dunas afirmou que não recebeu oficialmente a conclusão dos trabalhos de auditoria e “estranhou” que o resultado tenho sido publicado “sem que seu teor seja conhecido pelo concessionário”. “A Arena das Dunas se posicionará oficialmente após conhecer e analisar a íntegra do referido relatório, informou.
De acordo com a Control, o estudo levou cerca de um ano para ser concluído. O contrato de parceria público-privado foi firmado para construção e administração da Arena das Dunas – erguida no lugar do Estádio João Machado, o Machadão (demolido) – para sediar quatro jogos de futebol durante a Copa do Mundo de 2014, realizada no Brasil. A empresa OAS foi a vencedora de uma licitação internacional.
O valor do prejuízo estimado é quase o mesmo do valor que foi gasto na obra. Na entrega da obra, o governo anunciava que a Arena tinha sido construída ao custo de R$ 423 milhões.
“Tudo isso pode ser recuperado. Como o contrato ainda tem mais de 10 anos pela frente, é possível fazer isso. Seria bem mais difícil se a empresa já tivesse recebido todo o valor”, considerou o controlador geral do estado, Pedro Lopes. De acordo com ele, o documento será enviado para outros órgãos, como: a Secretaria Estadual de Administração – responsável pela gestão do contrato – o Gabinete Civil e Procuradoria do Estado, além do Tribunal de Contas e a delegacia da Polícia Civil responsável por investigações de crimes contra o patrimônio público e corrupção.
Questionado se há indícios de corrupção no contrato, o controlador afirmou que caberá à investigação da Polícia Civil dizer.
Do total de R$ 421 milhões de prejuízo estimado, R$ 361,2 milhões seriam referentes somente aos repasses fixos mensais que o governo do estado faz à Arena para pagar o custo da obra de construção. De acordo com a auditoria, para realizar a obra, a empresa pegou empréstimos de R$ 475.851.000,00 ao BNDES e outra financeira. Ao fim do período, pagará R$ 837.813.203,00, considerando amortização e taxas de juros.
Atualmente, o estado repassa cerca de R$ 10 milhões mensais à administradora da Arena. Desse total, 85%, cerca de R$ 8,5 milhões, são fixos e dizem respeito à infraestrutura. Com isso, ao fim do contrato, o Estado repassaria um total R$ 1,19 bilhão – uma diferença de mais de R$ 300 milhões, e o que, para a Control, representa um enriquecimento indevido da empresa.
“Nós consideramos que a empresa já teve seu lucro na construção do estádio, afinal é uma construtora, e não pode ter um lucro sobre a operação financeira que ela conseguiu com um banco público (BNDES), com condições vantajosas. Nós entendemos que a empresa deve ter seu lucro, mas não enriquecer sem causa”, diz o controlador.
Para se ter uma ideia, a auditoria estimou que até outubro de 2019, a empresa já tinha pagado R$ 517,4 milhões aos dois bancos, enquanto o governo repassou para ela R$ 626,6 milhões. Uma diferença de pouco mais de R$ 109 milhões. Por causa disso, a procuradoria recomendou que o estado realize uma equiparação, deixando de pagar a parcela fixa por cerca de um ano, até que esse valor seja igualado. “Também recomendamos que depois disso, o governo só repasse mensalmente o montante compatível com a parcela mensal do financiamento”, afirmou.
Pelas condições atuais, o estado ainda deveria repassar mais R$ 572.348.376,15 à Arena das Dunas, mas a Control afirma que o governo só deve pagar mais R$ 211.141.930,07.
Valores a serem recuperados
- Com a limitação dos repasses mensais: R$ 361.206.446,0
- Com dedução do verificador independente: R$ 2.740.107,39
- Ajuste das fontes adicionais de receita: R$ 57.175.285,22
Empresa não repassou R$ 16 milhões de lucros de eventos
Como parte interessada, o estado também recebe parte das receitas da Arena das Dunas, porém a auditoria constatou que a empresa repassava ao Estado a divisão do lucro bruto em vez da receita líquida, conforme previa o contrato. Com isso, apenas R$ 1,5 milhão, de mais de R$ 17 milhões, previstos, foram repassados. O prejuízo acumulado seria de R$ 16.316.665,96.
De acordo com a Control, a empresa alegou que se baseou em um documento enviado pela então Secretaria Especial da Copa (Secopa), em 2013, que respondia a questionamentos sobre o assunto. Porém, o controlador Pedro Lopes argumenta que a resposta “equivocada” não poderia substituir o que está previsto numa cláusula contratual.
Por outro lado, o documento também prevê pagamento de multa do Estado por atraso de pagamentos no valor de R$ 26.162.328,75.
Outros prejuízos
Ainda de acordo com a Control, o governo não vinha deduzindo dos repasses mensais os valores referentes ao pagamento de um verificador independente (uma espécie de juiz que analisa as demandas dos dois lados do contrato) desde 2018. E os montantes recolhidos desde 2015 estariam abaixo do que deveriam ser. Somente ai, o prejuízo já estava estimado em R$ 195,4 mil. Também foi verificado pela controladoria, um valor excedente no contrato dessas pessoas jurídicas. Dessa forma, o contrato foi reduzido de R$ 37,5 mil para R$ 30 mil.
Entre outras constatações, pela ausência de contador e equipe técnica durante atuação da empresa de engenharia, entre agosto de 2018 e julho de 2019, a Control considera que o governo tem um “crédito” de R$ 78.704,85. O total de créditos dessa contratação soma R$ 357.981,47.
Recomendação
“A pandemia faz com que o Estado do Rio Grande do Norte tenha sido atingido por verdadeiro evento de força maior, nos termos da Cláusula 47.1.2 do Contrato de Concessão firmado entre as partes. Em razão disso, recomenda-se que o Estado do Rio Grande do Norte avalie o real impacto desse panorama sobre as suas capacidades de cumprir o contrato em questão nos termos que foram estabelecidos, visto que, caso as consequências advindas da crise causada por essa pandemia comprometam sobremaneira tais capacidades, poderá o Estado pleitear a recomposição do equilíbrio econômico-financeiro dos termos contratados, e, inclusive, a extinção da concessão administrativa ora analisada (Cláusula 47.4, do contrato firmado entre as partes)”, aponta o relatório.