Longe do terremoto político provocado pela divulgação da delação do ex-diretor da Transpetro, Sérgio Machado, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) entrou pela madrugada desta quinta-feira (16), na animada festa junina organizada pela senadora Kátia Abreu (PMDB-TO). Perto da mesa de senadores da base e oposição comandada por Renan, o deputado Tiririca (PR-SP) tentava esquentar a pista de dança cantando forró e uma fogueira aquecia os convidados. Mas o que deve ter ardido para valer foi a orelha do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, nome repetido à exaustão pelo peemedebista, alvo de um pedido de prisão da PGR negado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Teori Zavascki.
A maior parte do tempo, entre um gole e outro de uísque, Renan riu e contou piadas incluindo as dificuldades que vem enfrentando ao longo dos últimos anos. Mas volta e meia o assunto voltava para Janot, que nesta guerra declarada, agora terá um dos vários pedidos de impeachment protocolados no Senado analisados.
Renan já chegou na festa mostrando no celular, nas rodas de conversa, uma notícia com declarações de Janot que dizia: “Mais de 20 políticos citados: Manter sigilo de delação de Machado geraria crise entre Poderes”. Inconformado, Renan dizia que os vazamentos foram permitidos “de forma covarde” comprometendo os citados sem “comprovar a materialidade” das acusações.
— Essa notícia comprova que Janot está estimulando os vazamentos. Isso é uma irresponsabilidade. E como pede a prisão com base em flagrante armado, sem comprovação de materialidade e gravação de um chefe de poder com foro? Grampo de quem tem foro só é legal com autorização da Justiça. A gravação foi feita pelo Sérgio Machado para tentar dar materialidade às delações. Mas existe materialidade. Isso é um absurdo ! — protestou Renan, nas conversas com os senadores.
‘EU NÃO!, O SARNEY’
A senadora Kátia Abreu também criticou os pedidos de prisão e ambos concordaram que Janot “é fraco” e faz peças “sem consistência” que estão sendo derrubadas por Teori.
— Quando o Janot pediu as prisões ele colocou a corda no pescoço dele — comentou a senadora Kátia Abreu.
— E colocou lá no pedido que nós formávamos uma organização criminosa! — disse Renan
— E você era o chefe da organização criminosa — seguiu Kátia Abreu.
— Eu não! O chefe era o Sarney. Logo o Sarney, que já está fora de tudo? — explicou Renan.
Vez por outra Renan fazia uma menção sobre a divulgação da delação de Sérgio Machado envolvendo o pagamento de propina para a cúpula do PMDB na última década. Contou que o senador Roberto Requião (PMDB-PR) o procurou para comentar as notícias, preocupado.
— Você viu o teor da delação do Sérgio Machado? — perguntou Requião
— Não vi, estou aqui enrolado com essas coisas do Senado — respondeu Renan.
— Pois é. Você acredita que ele me citou? — completou Requião.
‘O CHEFE’ SARNEY REVOLTADO
Antes de seguirem para a festa de Kátia Abreu, Renan, o líder do PMDB Eunício Oliveira (CE) e o senador Eduardo Braga (PMDB-AM) passaram na casa de Sarney para acalmá-lo sobre as revelações da delação de Sérgio Machado. Sarney estaria inconformado com o parecer em que Janot o coloca como chefe de organização criminosa
Desafeto de Renan, o presidente afastado da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ) também volta e meia tinha seu nome citado, mas para o senador sempre ressaltar que não tem relações com o colega de partido.
— Não sei nada de Cunha, não estou acompanhando o seu caso lá na Câmara. O Eduardo não é meu malvado preferido — brincava sobre o apelido de Cunha.
Presentes à festa de Kátia, os senadores que integram a tropa de choque da presidente Dilma Rousseff na comissão do impeachment pediram a intervenção de Renan para acalmar a tropa de choque governista , principalmente os senadores Ricardo Ferraço (PSDB-ES) e Waldemir Moka (PMDB-MS) apontados como os mais brigões.
— O que está acontecendo com o Moka? Renan, você tem que arrumar uma namorada para ele. Está muito nervoso — sugeriu a senadora Vanessa Grazziotin (PcdoB-AM).
—Eu não!! Não arrumo nem pra mim. Pede pro Eunício arrumar, ele que é candidato a presidente do Senado — respondeu Renan.
Ele prometeu, entretanto, divulgar uma nota hoje alertando o consultor do Senado, Diego Prandino Alves, coordenador da comissão pericial, a agir com isenção e imparcialidade na perícia requerida pela defesa de Dilma. Ontem a comissão rejeitou a impugnação da indicação de Prandino, acusado por José Eduardo Cardozo de ter engajamento político contra Dilma e movimentos de esquerda, em suas publicações no Facebook.
Aproveitando a deixa, a senadora Kátia Abreu tentou demover Renan da intenção de lançar hoje às 11 horas o livro sobre a votação no Senado que aprovou o afastamento de Dilma, intitulado “As 20 horas da História”, contando minuto a minuto a sessão que entrou pela madrugada.
— Essa é a pior hora para você lançar esse livro. Você não pode fazer isso agora antes da votação do impeachment. Estará cravando que Dilma já está condenada. Só falta ter na capa uma forca com a cabecinha dela pendurada. Por favor, desmarque esse lançamento — apelou Kátia Abreu.
— Não! Cada página desse livro foi editada pessoalmente por mim para mostrar minha isenção como presidente do Senado. O Janot vive querendo me afastar então eu tenho que lançar logo esse livro. Eu gosto muito da Dilma. Vou levar o livro para ela de presente — brincou Renan.
— E ela vai tacar na sua cabeça — respondeu Kátia Abreu.
O Globo