Nas últimas pesquisas de opinião pública quantitativas um fenômeno tem chamado a atenção da crítica especializada em política. Uma fórmula que parecia mágica, descoberta e sintetizada em uma frase pelo estrategista do ex-presidente norte-americano Bill Clinton, James Carville, de que era “a economia, estúpido” que relacionava o aquecimento econômico com as preferências eleitorais parece não estar funcionando. Ao passo que a economia brasileira cresce, a popularidade do presidente diminui.
Como explicar esse movimento que parece atingir um dos preceitos do comportamento eleitoral em todo o mundo? Há uma hipótese. Nessa relação econômico-eleitoral existe uma peça chave chamada emissor. Aquele que emite a notícia. O responsável por trazer as boas novas. Aquele que precisa te passar credibilidade para você comprar o produto. É o coração da marca.
Em 1975, num dos primeiros testes de neuromarketing experimentados no mundo, a Pepsi Cola inventou a prática do teste cego, era o “Desafio Pepsi”. Ou seja, algumas pessoas selecionadas qualitativamente, reuniam-se numa sala e experimentavam vendados um copo de Pepsi e um outro copo de Coca-Cola, sem terem a mínima ideia de qual era qual. No final do teste, um resultado animou os idealizadores: 50% preferiam a Pepsi e 50% preferiam a Coca. Para quem tinha um mercado tão menor, não fazia sentido que se as pessoas gostavam de ambas do mesmo jeito porque na hora de comprar elas optavam pela Coca-Cola.
Muitas teorias se levantaram, se era porque no início a Pepsi era mais doce e por isso agradava o paladar de imediato, se havia alguma diferença na sensação térmica que cada uma causava – inúmeras teses foram testadas e nenhuma tirava uma conclusão precisa. Em 2011, o mistério parece ter sido resolvido. Repetido o teste, repetiu-se o resultado. No final, o pesquisador resolveu fazer as pessoas experimentarem novamente, mas dessa vez, sabendo o que elas estavam tomando, mostrando os rótulos, e daí o resultado foi: 75% preferiam a Coca-Cola e 25% a Pepsi.
Foi feita uma imersão com as pessoas para entender o porque dessa mudança. Daí viu-se a importância do que é a marca. A Coca-Cola representava valores, representava a ideia de uma família unida no Natal, de alegria, de felicidade, remetia à infância, aos cuidados maternos, a uma série de sensações que estão no íntimo do ser humano e que pouco importava se o sabor dela fosse o mais agradável ao paladar.
O ponto mais importante da pesquisa é que quando as pessoas são informadas sobre o emissor, ou seja se bebiam Coca ou Pepsi, houve uma mudança na localização da atividade cerebral. Além do putâmen ventral, houve fluxos sanguíneos registrados no córtex pré-frontal, que é uma parte do cérebro, responsável entre outras coisas pelo raciocínio e discernimento mais complexos.
Nessa linha, fazendo um comparativo com o Brasil de hoje, é muito provável que estamos tomando a Pepsi, ou seja, o sabor das coisas está no caminho correto, o problema é que elas não nos dizem nada. O Brasil veio de uma crise econômica extremamente séria, que gerou uma quantidade enorme de desempregados e problemas sociais graves, como a possível reentrada no mapa da fome, além do aumento da violência urbana, que tem tirado o sono dos cidadãos. Mas, em 2017,
o país começa a apresentar uma leve recuperação econômica e os prognósticos para 2018 são animadores, com previsão de crescimento de até 3% do PIB.
Nota-se, no entanto, quando acompanhamos grupos de pesquisa qualitativa, que há uma desconfiança gigantesca das pessoas com o andar da carruagem. Elas tem dificuldade em aceitar que este governo possa estar fazendo algo de bom. Mesmo, por exemplo, quando houve a liberação do FGTS, algo que atingiu positivamente e diretamente as pessoas, elas ficavam incrédulas, esperando qual seria a “maldade” que viria na sequencia.
É recorrente ao questionar os participantes sobre a figura do presidente, respostas de repulsa, de comparações com vampiro e com coisas que levam a sensações ruins. O enredo em torno do presidente causa esse tipo de reação nas pessoas, seja pelos envolvimentos nos escândalos, seja por sua própria aparência ou pela maneira como se tornou presidente (apesar da maioria ter aprovado o impeachment, o processo é desgastante e gera dúvidas sobre fidelidade e comportamento). É o emissor desgastado.
As reformas, os ajustes fiscais, o teto dos gastos, tudo isso tem uma razão a ser feita e, tirando a crítica ideológica, são aceitos pela maioria das pessoas que tem a compreensão dos problemas econômicos que o país enfrenta. As classes mais baixas, apesar de não terem votado nesse modelo econômico e terem se sentido traídas ainda pela presidente Dilma Rousseff com algumas dessas medidas, entendem que a crise é séria e são necessárias mudanças. Não obstante, vejamos que essa mesma linha econômica tem sido adotada pelo presidente argentino Macri, que acabou de ter uma vitória esplendorosa contra sua principal oponente, Cristina Kirchner, neste final de semana, nas eleições legislativas.
Não que as pessoas vão começar a gostar das reformas, mas com absoluta certeza vão gostar dos resultados que elas deverão trazer. Por mais impopular que parecem elas poderão gerar um interessante fenômeno em 2018. Uma aprovação do governo e uma rejeição ao governante. Em 2014, o Rio de Janeiro viveu algo semelhante. O ex-governador Sergio Cabral estava no auge da impopularidade após as gravações da Máfia dos Guardanapos e mesmo assim conseguiu eleger seu sucessor, o atual governador Pezão. Em que pese toda a crítica e raiva da população contra Cabral, o governo tinha boas realizações para mostrar. Quando alterou-se o emissor, Pezão virou o dono das boas novas e a população resolveu abraçar sua candidatura, concedendo-lhe o cargo de governador.
Dessa forma, fica mais claro entender alguns movimentos de candidatos do centro, principalmente Geraldo Alckmin e João Dória Jr., de preservarem as críticas ao governo e defenderem as medidas macroeconômicas tomadas. O cálculo é que 2018 está chegando, o país deve conseguir um crescimento razoável, a economia reaquecer, as famílias retomarem poder de compra com mais crédito no mercado e inflação controlada, e a grande oportunidade que há é de manter as conquistas , trocando aquele que “atrapalha” o processo, o atual emissor.
Bruno Soller. Sócio da Travessia Estratégia. Consultor político e especialista em pesquisas.
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